“PENSANDO E SE DIVERTINDO; SE DIVERTINDO E PENSANDO”: SOBRE O CICLO DE DEBATES DE ESPETÁCULOS DO FNT GUARAMIRANGA
Em algum momento da história humana estabeleceu-se que caberia à arte, à filosofia e à ciência, atravessar solitariamente a história, o tempo e as culturas. Mas ao contrário, percebemos que o cenário criativo dos mundos é diverso, múltiplo e inacabado. Já disse um pensador que filosofia é criação, que arte é criação, que ciência é igualmente criação. Corroboramos com essa ideia. São diversas as formas de criar. Espraiam-se no mundo, saberes e fazeres criativos que se complementam, se interpenetram, sem hegemonia, sem fragmentação. Lamentavelmente, seja por questões epistemológicas, ideológicas, ou luta pela hegemonia, ou desejo de poder, ou por tudo isso e muito mais, as muitas formas de saber e fazer foram sendo isoladas entre si.
Um exercício permanente no FNT é esvaziar essa premissa e pautar-se no fortalecimento das vias ligadas, cruzadas, encruzilhadas, dos caminhos que se retroalimentam, se transubstanciam, se intercruzam. Ao escrever “Pensando e se divertindo; se divertindo e pensando”, tão caro ao fazer e pensar de Brecht, faz-se uma alusão à estratégia pedagógica e de apreciação artística adotada pelo FNT ao longo da sua existência: assistir aos espetáculos e posteriormente refletir sobre, com os criadores, com os artistas, e criadores convidados, uma visão externa, para melhor olhar, “ad-mirar” – o que é próprio do teatro.
A Escola Livre de Teatro do Maciço de Baturité, em Guaramiranga, foi criada pela mesma instituição que criou o Festival. Porque o Festival é uma escola, também. Uma forma sistemática de ensino e aprendizado. Muitos jovens da cidade se profissionalizaram, se qualificaram, a partir das suas experiências no FNT, seja como artista, seja como técnico da cena. De 1996 até 2013 tive a sorte de acompanhar esse “mãos às obras” de forma sistemática e ininterrupta, participando dos Debates sobre os Espetáculos e demais ações formativas, entre elas o Encontro de Artistas Pesquisadores.
No FNT percebemos que constitui um privilégio ter uma fala qualificada sobre a obra; ter uma análise qualificada e despretensiosa acerca da sua criação. Um ato de generosidade da parte de quem ouve, mas igualmente de quem debruça seu pensamento e sentimento, trazendo à baila abordagens potentes, delicadas e até mesmo definidoras de aspectos até então imperceptíveis, por parte dos criadores. Essa compreensão é tamanha que, mesmo quando o Festival era competitivo, os Debates aconteceram permeados de carinho, afeto e entrega, salvo raríssimas exceções. Hoje o Debate sobre os Espetáculos constitui um momento da Escola Livre de Teatro do Maciço de Baturité, quando jovens da região serrana chegam à Guaramiranga para viver e ouvir teatro; para sentir a voz da criação; para trocar, intercambiar; para aprender, apreciando; para mergulhar na ideia: “Pensando e se divertindo; se divertindo e pensando”.
Rejane Reinaldo,
Coordenadora dos Debates do 26º FNT .